sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Só imaginando.

Cenário um: Um pai. Uma mãe. Uma menininha. O pai, agressivo. A mãe, covarde. A mãe vai embora. A filha fica com o pai. O pai tinha uma amante, que tinha uma filha, que era violentada por ele.

Cenário dois: Um pai. Uma mãe. Um menininho. A mãe vai embora. O pai também; é assassinado. Um filho fica com a avó. O outro é preso por assalto a mão armada e com acusações de estupro.

Cenário três: A menininha da primeira história se encontra com o menininho da segunda. Agora eles são: Um pai. Uma mãe. Um menininho que pegou emprestado o nome do pai. O pai, suposto ídolo. Suposto assassino também. A mãe, suposta modelo. Suposta garota de programa.

Cenário quatro: A mãe foi morta. Pelos amigos do papai. O papai foi preso. O menininho ficou sem pai, sem mãe.

Os personagens das histórias têm nome. Nome conhecido. Era pra ser só mais um caso policial, como tantos outros. Mas não foi. No último ano tivemos overdose da tal história. A mídia fez o papel que tantas vezes cumpre muito bem de des-informar e fez do que era para ser um caso de polícia, algo muito próximo de uma trama da novela das 8. Mas isso já é clichê.

Era uma tragédia anunciada. A suposta crueldade e os motivos obscuros chamam a atenção, mas sinceramente não entendi a surpresa. É só mais um caso, entre milhares, ou não? Hoje eles foram pronunciados e serão, logo, submetidos a um júri popular. E eu não consegui sentir um segundo de satisfação com isso, ou de alívio, ou do que chamam de justiça-sendo-feita.

Talvez eles sejam assassinos. Talvez vítimas. Se algum for, de fato, o assassino, será apenas mais um, entre centenas que são diariamente soltos, porque a mídia só tem olhos para o que quer ver. Parei há tempos de ler as notícias do tal caso, porque é angustiante. É que enclausurar este pessoal dentro de quartos apertados, frios e com mal cheiro não satisfaz meus desejos humanos mais íntimos pro mundo. Não mesmo. À princípio, é confortável imaginar que mais um ser que possa me fazer mal estará enjaulado. Mas... não é isso que eu espero pro mundo no qual eu ainda não perdi a esperança de viver.

Não consigo ter raiva do tal moço. Ter raiva do que, de quem? Quem é o culpado do que? Aonde começa o problema? E aonde acaba? Aonde vai parar? Quem são as vítimas? Também tenho culpa por assistir parada ao Estado produzindo assassinos, criando pequenos monstros e loucos. E você também tem.

Aí, seja por questões genéticas, seja por questões sociais eu não consigo achar que o menininho lá de cima que herdou o nome do pai vá ter uma infância ou uma vida feliz e digna... Poxa, é só ele começar a entender as coisas e vai descobrir que a mãe está morta, talvez, pelo pai, que por sua vez está preso; e que ele mora com a avó que abandonou a mãe ou com o avô que a abusou.

Me entristece saber que eu tenho cama, comida, emprego, colo de mãe e pai, conforto, estrutura, instrução, educação, alegria, motivos pra achar que eu sou a pessoa mais feliz que já houve, boas lembranças na memória. E que este menininho, representante de milhares de outros menininhos viverá certamente em traumas. Talvez uma vida parecida demais com a de seu pai ou de sua mãe pra imaginarmos que coisas boas possam acontecer pra ele.

Peço desculpas a mim mesma, por neste momento, estar pessimista e desesperançosa. A realidade que o suposto assassino e a suposta prostituta viveram é muito diferente da minha para que eu possa fazer um julgamento disso tudo, sem parecer uma louca cheia de compaixão com a vida alheia ou uma mulher indefesa e amedrontada diante da realidade.

Não quero eximir ninguém e isso também não caberia a mim, que sou pessoalmente e diariamente atingida pelo medo. Só realmente queria que este rapaz fosse inocente. Por nada. Apenas porque eu realmente gostaria que ele tivesse aproveitado a oportunidade de ser algo que a vida não oportunizou que ele fosse. A vida disse que ele não seria nada e até aqui ele tinha conseguido sozinho, o que foi predestinado a não alcançar: um futuro bom. E perdeu isso fazendo exatamente o que ele foi criado para fazer. Não estou e nem vou analisar como um ser que se denomina humano tem a coragem de fazer determinadas coisas, e eu nem sei, e não sei mesmo se ele fez. Mas gostaria que não.

Mas mesmo assim não é justo. Nada nesta história me parece justo.
Macarrão, Bola, Coxinha. Como eu posso exigir de gente com nome de comida ou de coisa, gente sem endereço, rumo e sobrenome que respeitem o próximo.

Como pedir algo a alguém que viu ainda adolescente os melhores amigos morrerem de tiro, ou de droga, a mãe apanhar do pai, o irmão ser preso, o pai morrer de dívida ou de desgosto...? Como pedir ou exigir qualquer coisa de alguém assim? Como pedir amor, compaixão ou respeito? Como exigir carinho, solidariedade ou responsabilidade? Como pedir amor à vida pra alguém que não conheceu. Nem o amor, nem a vida.

Infelizmente, não dá. E não vai dar ainda por muito tempo. Somos obrigados a fingir que não é com a gente, que ninguém perguntou, porque é o único jeito de viver nossas vidas. A gente se esconde por trás de muros altos e eles sobrevivem nos morros, ou atrás das grades. Mas cada amanhecer é tão triste pra eles, quanto pra nós, sob diferentes pontos de vista.

Eu queria que o tal Bruno, (e poderia ser Pedro, Felipe, João, Henrique), fosse inocente. ... E ainda quero. Fico aguardando dias melhores. Por enquanto, só imaginando.

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