quinta-feira, 31 de março de 2016

Nem ruim, nem bom.


Essa noite eu sonhei com você. Já tinha mais de um mês e foi a primeira vez. A primeira vez desde que você não está mais aqui. Sei lá. Não foi nem ruim, nem bom. Não, não é saudade. Eu não sinto saudade de você. A gente sente saudade de quem deixou coisas para trás. Você não deixou muita coisa por aqui. A gente sente saudade quando a presença é mais forte que a ausência. Quando ficou mais coisa do que foi. É verdade que ficou uma lista de filmes e séries a serem vistos juntos. Ficaram uns lugares para ir e umas viagens para fazer. Ficaram umas noites de amor para viver e umas posições para testar. Mas é bem verdade que isso não dá saudade nenhuma. São só filmes que eu não tenho interesse de assistir, séries que eu não quero acompanhar. São só músicas que eu não quero mais escutar. São só lugares que eu não quero ir. É isso. Na verdade você só deixou para trás coisas a não serem feitas. Sua presença aqui não me disse nada. Ficou uma sensação, um vazio de alguém que esteve aqui sem estar, que eu não conheci de verdade. Uma promessa muito diferente da oferta, uma propaganda enganosa, que é tão falsa que é engraçado feito piada; e não triste feito desamores ou tragédias. Tragédia anunciada que você foi desde o dia que anunciou sua vinda. O último livro que eu li contava a história de uma mocinha que escrevia uma carta de despedida para cada amor que ela deixava de sentir. Eu percebi que sempre fiz isso. Entre a ficção e a realidade, os meus textos sempre tiveram despedidas dos meus amores. Mas eu não estou aqui me despedindo de você. É que você não foi um amor. É, é óbvio que eu não te amei. Além do mais, a gente só se despede de quem está indo embora. E para ter ido embora você teria que ter chegado efetivamente algum dia. Se te parece estranho a verdade é que você nunca chegou de verdade. Nem sei se você existiu. Ou se eu te inventei.  Eu só me dei conta quando você não estava mais aqui. Quando você ia vir, fez as malas, o roteiro da viagem, me enviou o número  e horário do voo e do portão de chegada. Mas você nunca colocou os pés em terra firme, nunca foi visto desembarcando. Só te vi quando você fez o check-in de partida, quando tomou o caminho de volta. Eu não me despedi. Não teve tristeza, não teve até logo. Não teve perda, nem adeus. É isso aí, você vai ser sempre aquele estranho desconhecido que na nossa despedida deu boas vindas para outra pessoa. E teve uma lágrima, mas foi de raiva. Parece estranho? Parece não. É. Para mim também. Tudo é, você é. Você não trouxe nada, nem levou muita coisa, exceto por um livro estranho cujo final eu não tenho o menor interesse de saber. É isso, eu sonhei com você. E pensando bem, assim como você, não foi nem ruim, nem bom. 
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