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Eu só não aceito.


Que leio três ou quatro livros de cada vez e demoro meses para terminar, a maioria já sabe. Um dos que estava a ler nas férias de fim de ano me irritou e me pôs para pensar. O autor faz uma gracinha e me fez acreditar que um dos personagens principais tinha morrido. E fez isso no fim do que, se não me engano, era o penúltimo capítulo. Eu, que estava ali, na beira da piscina, com meu chapéuzinho para cobrir o rosto de branquela, lendo feliz da vida, sem soltar o livro desde o dia em que cheguei, me deparei com esta informação: Daniel morreu. Levantei, coloquei o livro em cima da mesa e fiquei lá, revoltada, chiliquenta, mal humorada, com o olho cheio de água. Fiquei com raiva do Carlos Ruiz Zafón. Fui nadar, andar de bicicleta, reforçar o protetor, p. da vida. Só conseguia pensar: "Não vou ler a parte que falta. Não aceito".

É que não aceito mesmo. Não aceito finais-não-felizes. Deveria ser obrigatório que livros com histórias tristes tivessem continuação. Assim não ia ser triste o final. Talvez só o meio ou o início. Se a chateação vem no meio do livro também não faz mal. Ainda sobra tempo de ajeitar a vida e mudar o rumo da história. Mas o final-não-feliz atrapalha meus sonhos coloridos e me deixa contrariada, como eu, definitivamente, prefiro nunca estar. Eu só não aceito. E acho que nem nunca vou aceitar. Vivo atrás do final feliz e só paro quando chegar lá. Não me importo com o que acontece no meio do caminho e você também não deveria se importar. Só sossego quando puder viver aquela paixão até o final, quando alcançar a presidência da empresa, quando acordar com meus três filhinhos correndo pela casa. Só paro quando estiver em absoluta paz e não colecionar nenhum desafeto ou inimizade. Só deixo de insistir quando chegar no lugar para onde estou indo, quando puder morrer de tanto amor em mim, quando tiver todo conhecimento que me couber. Só aceito quando a vida me olhar e com todas as cores possíveis me der a certeza de que o final é ali, o mais feliz que possa ser.

Só aceito quando puder ser do meu jeito. E como felicidade é escolha de cada um, meu final feliz é também escolha minha. Eu que defino quando chegar lá. Eu que opto pelas minhas maneiras de alcançar o final. Eu só não aceito. E não aceitei daquela vez. No fim daquele dia, entendi que eu não podia mudar o destino daquela turma, porque ele, literalmente, já estava escrito. Voltei para história, pensando: "vou encarar, ler e depois procuro um livro com final mais alegre". Estava bem ali, na página seguinte: o final feliz. Eu não precisava de ter esperado o dia todo para descobrir que a felicidade daquele pessoal estava bem debaixo do meu nariz. Mas foi bom assim. É exercício que as pessoas deviam praticar mais. Não aceitar nada que não pareça ser exatamente um bom final feliz. Eu só paro quando estiver no final e quando ele for tão espetacularmente bom quanto possa, em sua totalidade e simplicidade, ser.

Se o final feliz é uma escolha, faça a sua.

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