terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A dor do outro.

Quem me conhece sabe bem quanto eu rejeito determinados assuntos. Sabe bem quanto afasto e fujo de certas sensações que me afetam de um modo tão ruim a ponto de eu querer evitá-las.

Sou menina medrosa, mulher corajosa. Cheia de coragem abri minha janela, cheia de coragem me mostro mais que seria necessário, permito que as pessoas saibam mais sobre mim do que precisariam de saber, entrego meus mistérios. E com isso, crio outros tantos... Porque também tenho medos, também tenho incertezas sobre minhas verdades, questiono meus dogmas, duvido da minha realidade, não escrevo a melhor parte.

Falo sobre a morte do meu irmão, falo sobre religião, política e relacionamentos. Falo sobre já ter tido o coração partido e falo dos meus sonhos. Falo da minha família, do mundo encantado em que vivo. Falo sobre desejo, vontade e sexualidade. Falo sobre fidelidade, amizade e simplicidade. Falo sobre indignação, diferença e futilidades.

Mas difícil é falar sobre um medo que é do outro. Sobre algo que eu não experimentei e que parece tão distante de mim que eu preferiria negar, fingir que não existe.

Hoje, o assunto não sou eu. Hoje, faz uma semana que eu criei coragem para assistir às notícias sobre o estrago que as chuvas vêm causando. E, sinceramente, preferia não estar vendo. Mas não deu pra fingir que não estava acontecendo, apesar de me saber fraca porque é isso que eu gostaria de ter feito. Não olhar, pra não doer.

O fato é que enxergar esta dor nas pessoas e imaginar o que elas vem passando me desnorteia um pouco. Cada imagem parte meu coração em mil pedaços e me faz sentir uma dor que não é minha. Cada história contada, cada olhar cheio de sonhos destruídos, vidas esvaziadas, dor de perder quem se ama.

Da minha casa, do sofá da minha casa, é muito confortável olhar pro lado e ver meus pais, meus cães, saber que minhas fotos, cartas e roupas estão no meu armário, que tem água e comida na cozinha e que meu acordar amanhã trás mais uma manhã de paz, muito trabalho e uma felicidade simples, mas plena.

Eu não vou entrar na discussão técnica sobre o cenário, nem discutir os causadores, os problemas, o que poderia ter sido feito pra evitar. Não. Hoje o post é só um jeito de desafogar o vazio que assistir televisão tem me causado.

E será que eu tenho o direito de me sentir angustiada por eles? Será que eu, aqui feliz, sem um problema sequer nesta minha doce vida tenho o direito de me sentir tão triste com uma dor que não é minha? É solidário ou egoísta? É humano ou é confortável? Afinal de contas estou aqui, na minha vida. E vida é o que eles perderam. Casa, pessoas, coisas, fotos. Tudo. E nenhum de nós é capaz de mensurar o que estas pessoas devem estar sentindo.

Cada ser humano tem seu porto seguro! E ao perdê-lo? O que resta, o que sobra? Para algumas pessoas resta apenas a ausência e o sentido passa a ser somente uma busca. Uma busca muito triste e incessante por corpos, para que se ainda for possível garantir dignidade a alguém, que seja aos mortos. Ou pelo menos é nisso que se procura acreditar.

Ainda assim, tem gente lá, por força ou estado de choque, aparentemente, com mais força no olhar, com mais estrutura para suportar esta situação do que nós, do que eu.

Eu vou voltar pra mim vida. Vou lá, trabalhar, respirar, comer, sorrir, abraçar, viver. E o que me ocupa é uma espécie de culpa. E pareça estranho como soa na minha cabeça, mas eu preciso dizer. É uma culpa por estar tão feliz, por não poder, ainda que quisesse, compartilhar um sentimento que é deles. Assistir a tudo me garante uma felicidade intensa. Me garante valorizar bem mais a zona de conforto em que vivo.

É felicidade, satisfação, pena, culpa, solidariedade, compaixão. É intenso. É sufocante.

Nestas horas, vale agradecer pelo que há aqui. E pedir a Deus pelo que há lá.

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