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Versões de nós mesmos.


Olha só, tento entender. Para que iria você me procurar, não é mesmo? Que mais você ia querer ouvir? Que mais poderia ser dito? O que haveria a se acrescentar, não é isso? Já há outra versão contada. Já te contaram uma boa história. Já existe um conto feito. As redes sociais disseram algo também. Ora sob o filtro Lo-Fi. Ora sob as palavras de Clarice Lispector. Mas sério? Foi tudo que você pôde ver? Depois de tudo? Esta versão inventada ou contada de mim mesma? Ficção? Vida real? Consegue distinguir uma coisa da outra? Sério que meus olhos e meu sorriso não te dizem mais nada? Será que não há nada mais que você possa querer saber? Isso é o bastante? Tanta intensidade pode se transformar em tanta superficialidade? O que contaram por aí é suficiente? O que você consegue ver basta? Meu sorriso te diz alguma coisa além de alegria? Não? Sério, nem com esforço? Nada? Os olhos, então? Também não? Não consegue imaginar que a estampa é só disfarce? Só distração? Você acha mesmo que sou só isso que se vê? Sério? Não, não posso me contentar que tão pouco te baste.

Eu sei, sua versão de si mesmo é mais enxuta. Tão pouco é contado, quase nada é dito. O que não quer dizer que silêncios não me digam muitas coisas. Seu sorriso e seus olhares me dizem muito. Me disseram muito, na verdade. Agora, são só um vazio. Uma falta, uma ausência. Uma dúvida. Agora ambos, - sua boca e olhos -, me fazem perguntas sobre aquilo que eu achei saber sobre você. Seu silêncio pergunta na minha cara se o que eu vi aí foi real. Sua inércia me pergunta aos berros se você pode ter me enganado tanto assim. Continuo não me contentando. Não me contento em saber tão pouco. Nem em ter. Não posso aceitar este nada. Acho que você é mais. Acho que quer mais. Acho que vale mais, cabe mais. Vive mais. Vive mais? Seja mais? Seja meu? Seja mais meu? Continuo esperando que você se arrisque mais, talvez, de repente. E veja quanto o lado de cá pode ser espetacular. Não adianta, não me contento, preciso acreditar que o que quero é realizável.

Será que somos tão diferentes assim? Ou quem me enganou fui eu? Quem engana quem quando alguém se engana? Eu engano você ou você se engana sozinho? Você me engana a seu respeito ou faço isso sozinha? O que somos capazes de dizer sobre nós mesmos? O que cada um de nós é, além de verdades inventadas? Personagens de uma história nem sempre real. Com finais nem sempre felizes. Quase sempre não felizes. Será que minha versão de você não foi criada só para a minha diversão? No fundo uma versão não contada às vezes diz mais do que aquela que é gritada, escancarada. Eu, por exemplo, quando eu não sei, invento. Quando não te entendo, finjo. Quando não te vejo, crio. Sobre mim o que eu grito traz muito menos de mim do que você imagina. Imaginação. Não me imagine. Me saiba. Não me procure. Me ache. Não acredite em versões de mim. Descubra as verdadeiras. Ou descubra a que melhor te convém. Há sempre uma versão boa de nós mesmos para cada pessoa.

Seja uma versão boa para mim. Descubra a boa versão que existe em mim para você. Eu sei que eu vejo o mesmo que você. E eu sei que repito as mesmas palavras para dizer cada vez algo diferente. Sempre igual, para dizer outra coisa. A rima é a mesma, para dizer o contrário. A direção se repete, para chegar ao avesso. Sempre confusa. Mas ainda diferente, tranqüila e contente.

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